Rota das Charqueadas em Pelotas (RS) remete o turista ao século 19
Luciano Nagel
Pelotas (RS) A rotina dos tropeiros gaúchos, dos negros escravizados e suas tradições pode ser conhecida na rota das charqueadas de Pelotas, a 262 km de Porto Alegre, no sul do estado. Além da produção de doces, que coloca a cidade em destaque do país, Pelotas reúne casarões antigos do século 19 que preservam parte da história do charque (carne bovina seca e salgada) do Rio Grande do Sul.
As charqueadas eram o conjunto de imóveis onde se produzia o charque, muito consumido pelos gaúchos até os tempos atuais. A 15 minutos do centro de Pelotas, o conjunto de casarões, todos em estilo colonial, fica às margens do arroio Pelotas. Parte foi convertida em pousadas e museus.
Eram nesses casarões que os tropeiros conduziam o rebanho de gado e abatiam o animal. Do boi era tirado o couro onde era feito a ‘’pelota’’, que era uma pequena embarcação de vara de corticeira (árvore) forrada de couro usada na travessia do arroio (córrego).
Nessa embarcação, puxada a nado por um escravo (que segurava as cordas pela boca), era levado o charque ou, em certa ocasião, até mesmo o patrão, esposa ou filhos para o outro lado da margem do rio. Daí que surge o nome da cidade de Pelotas.
Do gado, se aproveitava além do couro, o pó dos ossos que eram utilizados para fazer fertilizante, o sangue para gelatina e os chifres para várias utilidades como a confecção de pentes e botões, por exemplo.
Já a carne do boi era cortada em mantas, salgada e posteriormente penduradas em varais que ficavam expostas ao sol durante dias até desidratar totalmente. Todo esse processo era exercido por escravos e tinha como objetivo conservar o produto para a comercialização que era vendido para a região central e norte do Brasil, principalmente para a alimentação deles.
Atualmente, a região das charqueadas pode ser visitada pelos turistas. Entre os casarões que estão de portas abertas estão a charqueada Santa Rita, local tornado pousada que mantém a estrutura original de 1826. Próximo ao casarão, há um pequeno museu que resgata a história do charque.
Ao lado da Santa Rita, há outra construção, a charqueada São João, que já serviu de cenário para a gravação da minissérie brasileira ‘’A Casa das Sete Mulheres’’ e o filme ‘’O tempo e o vento’’.
O casarão construído entre 1807 e 1810 ainda conserva o esplendor da época e atualmente é um museu aberto ao público desde o ano 2000. Com guia local, o turista conhece a história do ciclo do charque, o período de escravidão, a rotina dos tropeiros e dos charqueiros.
No local, o turista pode ver os utensílios domésticos que eram usados para a produção do charque, como a pá de sal, que era utilizada pelos escravos para jogar o sal em cima das mantas de carne, as facas (punhais) que serviam para degolar o boi após levar uma marretada na cabeça e ser ferido com lanças nas pernas, além dos ganchos (de ferro), onde os pedaços de carne bovina eram pendurados para depois serem cortados em mantas e posteriormente expostos ao sol.
A preparação do charque, naquela época, era feita de forma rudimentar: os bois eram mortos a céu aberto, no pátio das estâncias e a secagem da carne era feita ao ar livre.
Não muito longe da São João, fica a charqueada Costa do Abolengo. O local, pouco antes da pandemia do coronavírus, era ponto de festas eletrônicas frequentadas por muitos estudantes universitários e jovens em geral.
Agora, em momento pandêmico, a área está aberta para visitação de famílias com passeio a cavalo, quadras de futebol e tênis, além de cadeiras relaxantes à beira do arroio que são convidativas para o descanso ou uma boa leitura de um livro. O projeto é que o casarão de paredes brancas e janelões verdes se torne em breve uma pousada.
Também na região está a charqueada Boa Vista, construída em 1811. O espaço, nos tempos atuais, é destinado a realização de eventos, como festas de casamentos, formaturas e batizados. Quem visita a mansão ainda tem a oportunidade de tomar um café colonial, fazer um piquenique ou almoçar com a família mediante agendamento prévio.