Astrônomo amador usa praça no Ceará para aproximar moradores das estrelas

Ideídes Guedes

Fortaleza “Esta história, que você vai ler aqui, quem me contou foi um menino que vive no futuro”. A frase de Ziraldo remete ao personagem Zélen, de O Menino da Lua, de 2006. O trecho da obra infantil poderia se referir, facilmente, a Lauriston Trindade, décadas antes. Sonhador e futurista, o cearense de 42 anos se apaixonou por astronomia ainda em 1986, na última aparição do Cometa Halley.

De lá pra cá, o astrônomo amador vem descobrindo chuvas de meteoros e tem aproximado das estrelas os moradores de Maranguape, município da região metropolitana de Fortaleza. Graças ao astrônomo amador, Maranguape, que se tornou conhecida no país por seu filho ilustre, o humorista Chico Anysio (1931-2012), aprendeu também a admirar o céu.
Astrônomo amador ajuda a organizar observações em outras cidades, como essa feita em outubro de 2017, em Maturéia – PB
Aos oito anos, Trindade foi a Fortaleza com os pais para comprar um videogame, um atari 2600, fenômeno de vendas na década de 1980, e voltou com uma luneta. Foi ali que a paixão pela astronomia desabrochou.
O menino passou a ler, estudar e andar para cima e para baixo com o presente. Nos intervalos das observações, buscava, na biblioteca pública da cidade, informações nas enciclopédias desatualizadas.
Do livro “Da Terra às Galáxias: uma introdução à Astrofísica”, de Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, de 1975, copiou toda a tabela de eventos astronômicos que iriam acontecer nas décadas seguintes. “Eu li esse livro umas cinquenta vezes, talvez. Teve um eclipse nos anos 2000 que eu esperei, basicamente, vinte anos por ele”, lembra.
Ainda na década de 1980, soube da existência de um telescópio em Maranguape. Atrevido, acordou cedo e foi à casa do dono do instrumento e pediu para vê-lo.
“Comentei que eu gostava de astronomia, que tinha uma luneta e perguntei se era possível eu dar uma olhada no telescópio. Não queria nem colocar o olho na ocular, queria só ver”, rememora. No entanto, a resposta foi desestimulante: “Você é criança, e criança só serve para quebrar as coisas. O melhor que você faz é crescer. Compre o seu telescópio e olhe para ele à vontade”, ouviu antes de ser dispensado.
O “não” ficou na memória do menino por algum tempo. Já na fase adulta, ainda com a luneta, começou a pensar em atividades orgânicas ligadas à astronomia. Em 2013, juntou um grupo de amigos e arrecadou dinheiro para comprar o tão sonhado telescópio.
Desde então, coloca o equipamento na praça Capistrano de Abreu, no centro da cidade, para que as pessoas possam fazer observações. A atividade virou constante e permanece até hoje, envolvendo crianças, adultos e idosos.
“Todas as vezes que dispusemos câmeras, lunetas, telescópios em praça pública, centenas de pessoas se ‘achegaram’. Curiosos, empolgados ou tímidos, sempre cheios de perguntas, ficavam, pacientemente, na fila, esperando a chance de ver a Lua, Júpiter, Saturno. E, depois, todos querem saber quando a gente virá novamente à praça”, conta o astrônomo amador.
Praça Capistrano de Abreu, em Maranguape-CE, em imagem de 2015
As ações geraram convites, e Trindade começou a fazer parte da Bramon, a Rede Brasileira de Observação de Meteoros (Bramon). Em 2017, participou  da descoberta da primeira chuva de meteoros anuais por brasileiros, na parceria com colegas como Carlos Augusto Di Pietro, Marcelo Zurita, Marcos Jerônimo, Ubiratan Nóbrega, Diego Rhamon e Lucas Tranquilino.
Foram cerca de três anos de trabalho e a análise de mais de 86 mil registros no céu, na que foi considerada umas primeiras descobertas do gênero por pesquisadores brasileiros até hoje.
Naquele mesmo ano, a rede de monitoramento de meteoros brasileira decidiu procurar chuva de meteoros na Lua. Lua. O Bramon conseguiu registrar o impacto de um bólido celeste na Lua, que foi acompanhado por um flash.​