O dia em que um time do Paraná desbancou os gigantes soviéticos

Airton Donizete

MARINGÁ (PR) “Seleção Soviética vem disposta a esmagar o Galo”. Manchete do extinto “O Jornal”, de Maringá, no interior do Paraná, anunciava o confronto entre Grêmio Esportivo Maringá (GEM) e seleção da antiga União Soviética (URSS), em 13 de fevereiro de 1966.

O chamado “jogo do ano” reuniu mais de 20 mil pessoas , a capacidade máxima do Estádio Willie Davids, de Maringá, segundo a extinta revista Panorama, de Londrina. A preocupação com os soviéticos não era em vão. A equipe tinha no gol o lendário Lev Yashin, o Aranha Negra, considerado um dos melhores goleiros de todos os tempos, e o ponta direita Slava Metreveli, conhecido por “Garrincha russo”.

Time soviético em jogo no interior do Paraná, em 1966 – Revista Panorama/Reprodução

Os amistosos no Brasil serviam de preparação para a Copa do Mundo de 1966, na Inglaterra, na qual os soviéticos ficaram em quarto lugar. Em Minas Gerais, a URSS goleara o Atlético Mineiro por 6 a 1, vencera o Cruzeiro por 1 a 0 e o Uberlândia por 2 a 0. Mas o GEM venceu-os por 3 a 2, fazendo valer a fama da equipe do interior, que conquistara o bicampeonato paranaense e o tricampeonato do norte do estado.

Se os soviéticos tinham Yashin e Metreveli, o GEM tinha o zagueiro Roderley Geraldo de Oliveira, que comandava a defesa e permaneceu na cidade após encerrar a carreira. Ele recorda que os soviéticos tinham uma estrutura de fazer inveja. “No intervalo, por exemplo, eles beberam crusch e comeram pão com presunto, e a gente só tinha uma aguinha pra beber”, conta.

Maurício observado por Roderley, atrás, defende bola chutada por jogador russo – Revista Panorama/Reprodução

Outro destaque era o goleiro Maurício Gonçalves, que também vive em Maringá. A maioria dos ataques soviéticos que passava pela zaga parava nas mãos dele. “Ficamos emocionados com o estádio lotado nos apoiando com muita empolgação”, diz. “Do outro lado, víamos o lendário goleiro Yashin e o habilidoso Metreveli, mas acreditávamos que tínhamos condições de vencer e foi o que aconteceu”.

Para Maurício, não houve surpresa, enumerando os títulos que a equipe maringaense conquistara nos anos anteriores. Ele cita a boa fase do artilheiro Edgar, autor de dois gols contra os soviéticos. “Ficamos com receio porque era uma equipe muito forte, mas não baixamos a cabeça e fomos pra cima”, afirma Edgar, que está com 81 anos e mora em Ponta Grossa (PR).

O ex-goleiro Maurício exibe lembranças do jogo entre o time de Maringá e a seleção da antiga União Soviética – Foto: Airton Donizete/Folhapress

O advogado Alcides Siqueira Gomes, que morreu há dois meses, aos 71, vítima de um acidente vascular cerebral (AVC), não participou do jogo, mas vivenciou-o, não apenas porque esteve no Estádio Willie Davids naquele dia memorável, mas por causa de uma lembrança especial.

Colecionador de cédulas antigas, ele contou em entrevista à imprensa local em 2018 que se aproximara de Metreveli e, com ajuda de um interprete em inglês, lhe dissera que queria ter uma cédula russa de cem rubros para agregar a sua coleção.

O craque lhe prometera enviá-la. Em pouco mais de 30 dias, chegava pelos Correios na casa do advogado o presente do ídolo soviético. Siqueira guardava-a com carinho entre outras da sua coleção.

Com renda de 63 milhões de cruzeiros, Luiz Roberto abriu o placar aos 13 minutos do primeiro tempo para o GEM. Edgar ampliou aos 20; os russos reagiram. Serebriniev marcou aos 27, e Banichewski empatou aos 42 da primeira etapa. Edgar voltou a marcar aos 13 da fase final dando a vitória ao GEM.

O então governador do Paraná, Paulo Cruz Pimentel, enviou cumprimentos à diretora do GEM e ao prefeito Luiz Moreira de Carvalho pela conquista da equipe maringaense.

Equipe do GEM. Em pé: Roderley, Oliveira, Maurício, Edson Faria, Haroldo e Pinduca; agachados: Luiz Roberto, Célio, Edgar, Zuring e Valtinho. Revista Panorama/Reprodução