Orçamento Participativo ‘corta’ moradores de assembleias em Porto Alegre

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POR PAULA SPERB, COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM PORTO ALEGRE

Cidade pioneira na adoção do OP (Orçamento Participativo), mecanismo governamental implantado pelo governo do PT nos anos 80 que permite aos moradores decidirem o destino de verbas públicas, Porto Alegre (RS) vai restringir o acesso de cidadãos a assembleias neste ano.

Além disso, o OP não aceitará novas demandas. É a primeira vez, em 28 anos, que isso ocorre. Nesse modelo, a população escolhe por voto direto, em assembleias abertas regionais, onde será aplicado o dinheiro da prefeitura.

A decisão por não votar novas demandas e não realizar assembleias abertas foi tomada pelos próprios conselheiros, os líderes escolhidos pela comunidade.

Eles decidiram cortar a participação popular após apresentação do prefeito Nelson Marchezan Junior (PSDB), eleito em 2016, sobre a crise financeira da prefeitura. Conselheiros que não quiseram se identificar contaram à Folha que diversos contrários à restrição acabaram mudando o voto após pressão de prefeitura.

Assim, neste ano, a comunidade não exercerá o voto direto sobre o destino de obras. Tampouco serão realizadas as assembleias abertas, que também servem para eleger os conselheiros do programa (dois titulares para cada uma das 17 regiões) e indicar delegados. A cada dez pessoas presentes, uma era indicada como delegado.

Em 2016, foram realizadas 23 assembleias. Agora, a participação popular será restrita: apenas os delegados e conselheiros poderão participar dos encontros.

Além disso, por causa da crise financeira, só obras atrasadas serão votadas –não haverá novas propostas.

A decisão por não votar novas demandas foi tomada pelos próprios conselheiros. Os líderes decidiram após apresentação do prefeito Nelson Marchezan Jr (PSDB), eleito em 2016, sobre a crise financeira da prefeitura.

A mudança foi criticada pela oposição, incluindo o ex-prefeito Raul Pont (PT), e é vista como um sinal de enfraquecimento da participação popular.

“Por que não realizar as assembleias e consultar a população sobre as obras atrasadas?”, questionou o professor Luciano Fedozzi, da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), que pesquisa o programa desde os primeiros anos de sua implantação.

Ele afirmou que o orçamento participativo já vinha perdendo força nas gestões recentes, tendo como ponto crítico a permissão para reeleição de delegados, em 2007. Com a medida, o conselho virou uma “oligarquia comunitária”, na avaliação do professor.

A gestão do prefeito Marchezan Junior nega, dizendo que os delegados de cada região continuarão se reunindo com a população.

“Os delegados são os representantes [dos moradores] que participam das assembleias”, disse o secretário-adjunto de Relações Institucionais, Carlos Siegle de Souza (PTB), que atua no OP desde 2011.

SEM PARTICIPAÇÃO

Uma pesquisa da UFRGS divulgada em 2016 mostra que cresceu, entre os participantes das assembleias, o número de pessoas que acham que os cidadãos não têm poder de decisão.

Em 1995, 0,5% achavam que a comunidade “nunca decidia”. Em 2015, esse índice subiu para 5,7% entre as 1.451 pessoas ouvidas.

Em 2003, quando João Verle (PT) era prefeito, o OP chegou a ter 52 mil pessoas nas plenárias. Já em 2015, 11.676 participaram das reuniões, redução de 78%.

OBRAS ATRASADAS

De 1990 a 2004, 95,5% das 5.556 obras votadas foram concluídas. Entre 2004 e 2016, porém, 55,87% de 3.345 obras não foram entregues, um total de 1.869.

Eleito em outubro de 2016 como oposição a Fortunati, o atual prefeito critica o atraso nas obras dos antecessores –diversos partidos da base da gestão anterior compõem seu governo, como PTB e PP, por exemplo.