Caça ilegal ameaça parque com pinturas rupestres no interior do Piauí

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ESTELITA HASS CARAZZAI
ENVIADA ESPECIAL A SÃO RAIMUNDO NONATO (PI)

Desde a pré-história, a caça é um fator quase cultural no interior do Piauí, que abriga o maior sítio arqueológico do Brasil e um dos maiores do mundo, no Parque Nacional da Serra da Capivara. Como a Folha mostrou neste domingo (21), o local, que foi destaque no encerramento da Olimpíada, vive sua pior crise financeira.

As pinturas rupestres de 10 mil anos atrás já retratavam a caça de veados, capivaras, emas, onças e tatus pelos homens pré-históricos, os primeiros a habitar o continente americano.

Ainda hoje, a carne de tatus, mocós (um roedor local) e aves como o jacu é apreciada por muitos moradores, especialmente os de comunidades mais isoladas.

Os caçadores revendem a carne no mercado negro. O quilo da carne do tatu pode chegar a R$ 70, segundo moradores ouvidos pela Folha. A do mocó varia entre R$ 10 e R$ 20.

Mulher caminha por plataforma dentro do Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piaui - Joel Silva/Folhapress
Mulher caminha por plataforma dentro do Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piaui – Joel Silva/Folhapress

 

O Parque da Serra da Capivara é o local preferido para a caça –por causa da preservação, ele reúne uma enorme quantidade de animais, muitos ameaçados de extinção.

ESPINGARDINHA

“Eles vêm à noite e colocam as armadilhas. De dia, passam para recolher a caça”, diz o guia Carlos Roberto Siqueira de Sousa, 44, ex-funcionário do parque.

A armadilha preferida é chamada de “espingardinha”, uma arapuca feita com um cano de ferro apontado para baixo. Ao passar debaixo dela, o animal é atingido na nuca, com pólvora.

Guarita abandonada dentro do Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí - Joel Silva/Folhapress
Guarita abandonada dentro do Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí – Joel Silva/Folhapress

Sousa diz já ter visto caçadores de manhã cedinho no parque, em busca dos animais capturados, com a ajuda de cachorros.

Nem todos usam armas. Em algumas pinturas rupestres, porém, nos sítios mais afastados das entradas, é possível ver marcas de bala nas rochas. Os funcionários dizem que foram caçadores, atirando “por brincadeira”.

Ao acenderem fogueiras, eles também aumentam o risco de incêndios –muito alto na região por causa do clima seco.

O ICMBio (Instituto Chico Mendes), responsável pela gestão do parque, e a Polícia Rodoviária Federal fazem operações contra a caça ilegal de tempos em tempos, além de campanhas de conscientização da população local.

O temor dos ambientalistas, agora, é que o Parque Nacional da Serra da Capivara fique sem dinheiro suficiente para combater a caça ilegal e proteger a reserva.

“Se o parque fechar, vai virar casa de caçadores”, diz a funcionária Maria de Jesus Conceição Pereira, 41, que atua nas guaritas do parque.