Pastor prega em “portunhol” para venezuelanos em cidade fronteiriça em Roraima
ESTELITA HASS CARAZZAI
ENVIADA ESPECIAL A PACARAIMA (RR)
É quase meio dia em Pacaraima (RR), na fronteira com a Venezuela. Em meio às ruas cheias de venezuelanos que carregam arroz e farinha, o missionário Moisés Colares, 39, sua ao gritar ao microfone.
“La hambre está inundando Venezuela. La hambre está em toda parte. Y el hombre não pode fazer nada”, prega, em portunhol, misturando as palavras “fome” e “homem” em espanhol ao seu discurso. “Surretate, Venezuela! La única saída é mirar para arriba!”, diz, em menção a “acima”, para o céu.
Alguns venezuelanos ouvem de longe. A maioria nem para: continua a carregar os sacos de comida que compram na cidade, para combater a crise de abastecimento que assola o país.
Os venezuelanos invadiram o Brasil nos últimos meses em busca de comida, como mostrou a Folha. Vêm de todo o país para comprar arroz, farinha, açúcar e óleo, em falta por lá.
Pacaraima, cidade de 12 mil habitantes, fica colada à divisa com a Venezuela: a rodovia que leva à cidade termina no país de Hugo Chávez, demarcado apenas por barreiras policiais, com passagem livre.
Muitos venezuelanos moram em Pacaraima, ou atravessam a fronteira diariamente para trabalhar do lado brasileiro, e vice-versa. Os brasileiros costumavam invadir a cidade-gêmea de Santa Elena do Uairén para fazer compras –o que acabou depois da crise no país vizinho.
Os pastores, também, cruzam a divisa com frequência.
Na rua, Colares não desanima à aparente indiferença e continua a bradar: “Chávez morió [morreu]. Y donde está Chávez? Donde está Simón Bolívar? Clama y ele não escucha [escuta]! Deus és mayor que Chávez, mayor que Maduro, mayor que Venezuela!”
Membro da Assembleia de Deus, o missionário diz que o número de venezuelanos que se converteu está crescendo.
“Muitos têm reconhecido que precisam de Deus”, diz à reportagem. “Eu já trabalhei em penitenciária, nas ruas… A fome que está lá dentro [da Venezuela] é incomparável.”
A Assembleia de Deus tem cerca de 300 fieis em Pacaraima, boa parte venezuelanos –e uma congregação em Santa Elena do Uairén. “Já são 40 pessoas lá”, comemora Colares.