Vereador deve sofrer censura pública após piada racista em Curitiba
POR JULIANA COISSI, DE CURITIBA
“Sabe por que preto vai à igreja evangélica? Para poder chamar o branco de irmão.” A frase foi disparada por um vereador de Curitiba a um colega de Legislativo, afrodescendente, durante uma pausa para um café. O caso virou alvo de inquérito por injúria racial na polícia e pode render uma censura pública ao autor da declaração, por sugestão da Corregedoria da Câmara.
Nesta segunda (15), a Corregedoria entregou relatório sobre o caso ao Comitê de Ética e Decoro Parlamentar, sugerindo como sanção a censura pública, a ser feita no plenário ou na mídia, a critério do comitê.
O episódio aconteceu no final de novembro, entre os vereadores José Maria Alves Pereira, o Zé Maria (SD), e Adilson Alves Leandro, o Mestre Pop (PSC). A frase, que para Zé Maria se tratou de uma piada, foi ouvida por outros três vereadores. “Quando ele me perguntou: ‘Ô, negão, sabe por que preto vai à igreja evangélica?’, eu fiquei mudo, não dei atenção, mas ele insistiu em completar a frase”, conta Pop.
Segundo ele, nenhum dos outros três colegas que presenciaram a conversa riu da declaração de Zé Maria. “Todos ficaram com cara pasma, olhando para ele. Meu sangue ferveu, meu estômago embrulhou, mas não consegui falar nada”, disse ele, que é vice-presidente da Federação Paranaense de Capoeira e está em seu primeiro mandato, com ações em escolas públicas para promover aulas de capoeira.
Zé Maria é empresário do ramo imobiliário e foi eleito vereador pela terceira vez, com trabalho voltado às pessoas com deficiência.
Minutos depois, ao voltar à sessão, Pop deixou o plenário, chorando, e registrou um boletim de ocorrência por injúria racial.
O delegado Ivo Dyniewicz Júnior, responsável pelo caso, disse que testemunhas e os dois vereadores envolvidos confirmaram o teor da frase e que a investigação prosseguiu porque o autor da queixa, Pop, não quis retirar a representação.
O inquérito policial foi concluído, segundo o delegado, “com indícios de injúria racial”, e remetido ao Ministério Público Estadual. A Promotoria pode, agora, pedir arquivamento ou oferecer denúncia à Justiça.
O Ministério Público informou que instaurou procedimento para investigar o caso. Para injúria racial, se houver condenação, a pena de reclusão é de um a três anos, podendo responder em liberdade, além de multa.
O autor da denúncia diz ter aceitado as desculpas de Zé Maria, seu vizinho de gabinete. Mas preferiu não retirar a representação. “Como ser humano, não guardo ódio. Mas o maior crime no Brasil é a impunidade. A pessoa te fala um mal feito e depois te dá um tapinha nas costas.”
À Folha o vereador Zé Maria disse que não é racista e que emprega afrodescendentes em seu gabinete. Disse ainda que o episódio é “matéria vencida” e que o colega parece “estar buscando espaço na mídia”.
“Acho que isso já deu o que tinha que dar, já pedi perdão, o cidadão já perdoou, não sei onde vai parar isso daí”, disse Zé Maria. “Isso está atrapalhando até a nossa vida de parlamentar aqui.”
Zé Maria disse que não houve maldade de sua parte e que tudo não passou de uma piada que leu no aplicativo Whatsapp e contou na ocasião. Ele afirmou ainda que nunca fez distinção de pessoas pela raça e que jamais faria declarações racistas. “Não é da minha índole, não meço as pessoas pela cor, e sim pelo caráter.”