Garimpo, alcoolismo e medo de perder direitos ameaçam índios
POR MARCELO TOLEDO, EM CARACARAÍ (RR)
A ação de garimpeiros, o receio de os indígenas perderem direitos constitucionalmente adquiridos e o alcoolismo são os maiores entraves enfrentados pelos povos que habitam aldeias na região Norte do país.
Nesse pacote de temor dos índios, estão as propostas da PEC 215, que transfere ao Congresso a atribuição de oficializar a demarcação de terras indígenas, a celeridade na obtenção de licenciamentos ambientais e a contaminação por mercúrio em rios próximos a comunidades.
“Temos uma série de dificuldades, mas a maior que enfrentamos hoje é em relação ao Estado. O que a gente preserva o Estado vem destruindo, até mesmo os direitos conquistados pelos povos indígenas”, disse Maurício Yekuana, 30, vice-presidente da Hutukara, associação de defesa dos direitos ianomâmis.
Segundo ele, por conta da PEC 215 tem aumentado a pressão e a invasão garimpeira em terras ianomâmis. “Um estudo feito no rio Branco mostrou que a água está contaminada com mercúrio. Isso foi comprovado também com análises de cabelo e sangue de índios, que já estão sendo atingidos”, afirmou.
Secretário de Estado do Índio, Ozélio Macuxi, 49, disse que a ofensiva dos garimpeiros se deve ao fato de as terras ianomâmis serem muito ricas. “Há muito ouro. Não vai parar [o garimpo]. É a Polícia Federal tirando, eles entrando. Toda hora tem um. Tem muito ouro e pedras preciosas”, afirmou.
A criação de uma unidade de conservação pelo Estado de Roraima também é vista por Yekuana como outro foco de enfrentamento com os indígenas, por ser a “porta de entrada” de autorização para a lavra.
“A gente entende que, quando se cria um parque, mais para a frente se autoriza a lavra minerária. O nosso objetivo é que o Estado tenha diálogo com a gente para definir, explicar qual é o objetivo dessas unidades de conservação que fazem sobreposição a terras indígenas”, disse.
A população indígena ocupa hoje 46% das terras de Roraima, conforme o governo do Estado. Segundo a governadora de Roraima, Suely Campos (PP), muitas das comunidades indígenas são produtivas, num raio de 50 km a 100 km da capital, Boa Vista.
NA ZONA URBANA
Outro problema enfrentado pelos indígenas atualmente, mas normalmente na área urbana das cidades, é o alcoolismo.
“A bebida é um problema muito sério entre eles, que também podem ser enganados facilmente na cidade, por não terem muita noção do valor do dinheiro”, disse Fernando Marcos Vieira da Silva Filho, chefe de gabinete da Prefeitura de Caracaraí e ex-secretário da Assistência Social.
De acordo com Macuxi, os ianomâmis têm dificuldade em controlar bebidas e drogas, razão pela qual muitos estão presos. Há, atualmente, 132 indígenas presos no Estado –principalmente por causa de brigas, drogas e estupros–, o que fará a Secretaria de Estado do Índio propor uma prisão exclusiva para indígenas.
“Há um índice muito grande de presos indígenas, que saem e voltam, e vou propor a cadeia pública para os índios. Se chega lá no bolo [de presos], o tratamento é igual. Só quem vai lá [numa prisão] entende isso.”
Para técnicos da Funai (Fundação Nacional do Índio) ouvidos pelo blog que atuam na frente de proteção dos ianomâmis, o alcoolismo pode ter sido o motivo para um índio disparar uma flecha em sua mulher numa casa de barro numa comunidade indígena distante 40 quilômetros de Caracaraí.
A mulher conseguiu colocar o braço à frente, que “amorteceu” o impacto da flecha. Mas ela foi hospitalizada, com ferimentos no braço direito e no abdome.