Moradores ‘descobrem’ que prédio onde moram tem dinheiro da Lava Jato
FELIPE BÄCHTOLD, DE CURITIBA
Moradores de um condomínio de classe média em Curitiba nem imaginam que o prédio onde compraram apartamentos e vivem é suspeito de ter sido erguido com dinheiro proveniente de lavagem do doleiro Alberto Youssef.
Denúncia do Ministério Público Federal afirma que o edifício, de 12 apartamentos, foi construído pelo doleiro e por uma incorporadora de propriedade do advogado Antônio Carlos Pieruccini, também réu em processo relacionado à Operação Lava Jato.
Youssef, diz a Procuradoria, ocultou sua participação no negócio.
Moradores ouvidos demonstraram surpresa ao saber, pela reportagem, da menção ao empreendimento no processo na Justiça Federal. Disseram nunca ter ouvido falar da ligação com o pivô da investigação sobre irregularidades na Petrobras nem sabiam da suspeita sobre o incorporador.
O edifício, chamado Dona Lila IV, fica a 10 km do centro de Curitiba e tem quatro andares. Concluídos há quatro anos, três dos 12 aptos permanecem sem nunca terem sido ocupados. Um deles está à venda por R$ 240 mil.
Segundo os moradores, essas unidades ainda pertencem à família do incorporador. As demais foram vendidas por meio de uma imobiliária.
À Folha o síndico, que pediu para não ter o nome divulgado, disse que estranhou apenas o fato de a família não se desfazer de algumas das unidades do prédio, apesar do mercado imobiliário aquecido, e também o alto volume de investimento feito pela empresa, pouco conhecida no ramo.
Mas diz não temer as consequências do processo na Justiça Federal porque possui escritura do imóvel.
A acusação de lavagem foi incluída em uma ação relacionada a supostos desvios da Petrobras envolvendo a empreiteira Mendes Junior. Pieruccini e outras três pessoas são acusados especificamente de lavar dinheiro a favor de Youssef.
De acordo com a denúncia, o doleiro firmou um acordo com o incorporador em que cada um ficaria com 50% do edifício. A empresa de Youssef, a GFD Investimentos, seria a responsável pela construção.
O Ministério Público Federal afirmou que a empresa GFD Investimentos “nunca possuiu” atividades legais e que toda a sua receita era proveniente de crimes. Na mesma ação, Youssef é acusado de investir em hotéis como maneira de justificar seu patrimônio.
OUTRO LADO
A denúncia afirma que os imóveis de Youssef na sociedade responsável pela edificação foram vendidos em 2013.
A reportagem não conseguiu localizar Pieruccini. À Justiça Federal ele afirmou que o R$ 1,4 milhão que Youssef repassou para a incorporadora representam o exato custo da construção do edifício.
A defesa dele negou as acusações e chamou a denúncia de “invencionice”. Disse que, se Youssef usou dinheiro de origem ilícita no empreendimento, o incorporador não tinha como saber. Afirma ainda que não teria motivo para “macular” seu projeto com recursos ilegais e que o crime de lavagem de dinheiro só existe no Brasil da forma “dolosa”.
A Folha não conseguiu localizar os advogados de Youssef para comentar o caso. À Justiça a defesa afirmou que não se pode considerar o patrimônio ilícito apenas por pertencer ao acusado.