Um ano após tragédia em Pedrinhas, caos persiste em prisão no MA

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JULIANA COISSI, DE SÃO PAULO

A imagem de cabeças separadas de corpos em meio a uma poça de sangue, cena gravada em rebelião de dezembro de 2013, circulou pelo mundo e revelou a barbárie nas prisões do Brasil.

O vídeo com o assassinato de três presos pelos próprios colegas apresentou o horror em Pedrinhas, complexo penitenciário do Maranhão onde 60 detentos morreram somente naquele ano.

Novas mortes, superlotação, rebeliões e fugas em massa ainda são cenas comuns no sistema carcerário.

 

O governo Roseana Sarney (PMDB) encerra 2014 sem resolver o caos em Pedrinhas. Os novos presídios no interior, prometidos para desafogar o sistema, ainda não foram entregues.

O novo governador, Flavio Dino (PC do B), assumiu neste mês com a promessa de abrir concurso para funcionários do presídio, concluir as unidades em obras e humanizar o cumprimento das penas.

Quem visita Pedrinhas hoje tem a sensação de estar em um filme que se repete. “A situação é desumana, um ambiente insalubre, de um fedor insuportável”, descreve a deputada estadual Eliziane Gama (PPS).

Também em visita no mês passado, o futuro secretário da pasta que gere os presídios, Murilo de Oliveira, encontrou ratos, lixo acumulado, rede de esgoto estourada e excesso de detentos.

Em 2014, foram 199 fugitivos no complexo, que abriga 2.500 presos. Uma das ações foi cinematográfica: um caminhão rompeu o muro do presídio e 36 presos escaparam, após troca de tiros.

A superlotação persiste como ingrediente para motins. Seis das oito unidades de Pedrinhas têm presos acima da capacidade. No CDP, palco da decapitação gravada em vídeo, há 528 homens para um espaço onde cabem 402.

VÍTIMAS

O inspetor penitenciário Isaac William Giusti foi o penúltimo dos 19 mortos de Pedrinhas em 2014. Ele foi baleado pelos presos enquanto tentava conter uma rebelião, em setembro passado.

Nos 23 dias em que ele permaneceu em coma, seu pai, Adhemar Giusti, 67, tentava encontrar vestígios de vida naquele corpo imóvel.

“Eu levantava a pálpebra dele, e a gente tinha impressão de que ele estava olhando a gente”. Giusti morreu horas depois de completar 38 anos.

Fora dos muros, a capital, São Luís, sofreu os efeitos da disputa de facções criminosas que dominam Pedrinhas. Em setembro, 17 veículos foram incendiados em três dias.

Os ataques não cessaram mesmo após a morte da menina Ana Clara, 6. Em janeiro, a garota morreu depois de ter 95% do corpo queimado em um um dos atentados a ônibus.

A mãe e a irmã de Ana Clara sobreviveram. Há um mês elas reencontraram Marcio Rony Nunes, 38, chamado de herói por entrar no ônibus em chamas para salvar as três.

REENCONTRO

O reencontro de Juliane Santos, 23, com o estivador Marcio Rony Nunes ocorreu em meio a lágrimas e agradecimentos.

Juliane estava com as filhas Ana Clara, 6, e Lorrane Beatriz, um ano e cinco meses, quando Márcio atravessou o ônibus em chamas para socorrê-las.

Os quatro sofreram queimaduras. O caso mais grave foi o de Ana Clara, que, com 95% do corpo atingido, não resistiu e morreu.

Começava para Nunes uma luta pela sobrevivência. As chamas tomaram quase todo seu corpo, e o levou a iniciar um longo tratamento em Goiânia.

Ele passou meses coberto com uma máscara no rosto e uma malha compressora envolvendo tronco e membros.

A cada troca de curativo, Marcio perdia sangue e padecia. “Passei três meses sentindo dor dia e noite”.

No final de novembro, o elogio informal que recebeu, de herói, foi formalizado. Marcio recebeu um capacete e uma medalha de honra ao mérito dos bombeiros de São Luís.

“No começo não gostava [do elogio de herói], mas tanta gente ficou falando que comecei a me acostumar”.