A via crucis de seis urnas eletrônicas pelos rios do Pará
LUCAS REIS, NO PARÁ
Nem bem amanhecia neste domingo (5) quando uma lancha partiu carregando urnas eletrônicas e funcionários da Justiça Eleitoral com destino a ilhas próximas a Belém, a capital paraense.
Para permitir o direito ao voto para todos, é preciso cruzar rios e alcançar comunidades ribeirinhas, como as localizadas em três das 39 ilhas de Belém.
Elas receberam as urnas eletrônicas apenas horas antes do início da votação, em uma medida de segurança, já que essas escolas não dispunham da proteção necessária para abrigar os equipamentos, segundo o TRE (Tribunal Regional Eleitoral).
Já eram 6h quando a lancha partiu, atrasada, com seis urnas (duas para cada ilha, uma para uso e uma de reserva), equipamentos de transmissão via satélite, documentos da Justiça Eleitoral e funcionários treinados para armar toda a estrutura. A Folha está nessa lancha.
Em todo o Pará, são 704 os locais de votação que atendem áreas ribeirinhas, reunindo cerca de 223,2 mil pessoas (4% do eleitorado do Estado). Há, ainda, 6.200 indígenas que votam em 18 seções.
A comitiva navega pelo rio Guamá e, 25 minutos depois, alcança o primeiro destino.
A ilha do Combu atende a 363 eleitores, moradores dos arredores que, assim como em toda a região, vivem em casas de madeira e palafitas e sobrevivem basicamente do extrativismo de açaí e cacau.
A lancha deixa o equipamento e um dos funcionários e, sem perder tempo, navega por mais 20 minutos até a ilha Piriquitaquara, que atenderá a 96 eleitores, onde repete o procedimento e já parte novamente pelo rio.
LABIRINTO
“Amigão, onde fica a escola?”, pergunta, aflito, o comandante da lancha a um ribeirinho, que aponta o local na ilha Grande, terceiro e último destino da viagem.
Já eram 7h, a votação em todo o país começaria em uma hora, e a embarcação já errara três vezes o caminho por entre o labirinto de selva e rio.
Moradores já formavam fila de votação na escola de madeira, às margens do rio Bijogó, quando a urna finalmente chegou. Presidente da seção há mais de uma década, Laurentina Damaceno, 48, aguardava ansiosa pela chegada dos equipamentos.
“Até dez anos atrás era difícil, não havia seção eleitoral aqui, o pessoal precisava tomar um barco e ir até Belém”, conta a professora.
Aos poucos, começam a surgir embarcações de todos os tamanhos e estilos, carregadas de famílias, eleitores e crianças, e enfeitadas com bandeirinhas dos candidatos.
A urna abre às 8h, e os eleitores da ilha Grande votam sem dificuldades ““serão 271 ao todo. Recebem café da manhã e, sem alarde, retomam aos barcos de volta para casa.
Diferentemente da cidade, o único barulho presente é o dos pássaros. Não há santinhos jogados pelo chão, cavaletes nem tentativas de boca de urna ““em cada ilha, pelo menos dois policiais fazem a segurança.
Bruno Vasconcelos, 28, o funcionário do TRE que fica na ilha para armar o equipamento, atua no local desde 2008 e explica porque prefere distância da cidade.
“Aqui é muito tranquilo, sem barulho nem fogos, não tem comparação com Belém. Nunca ocorreu nenhum problema ou confusão aqui”, conta.
Dificuldade, diz, apenas no fim da votação, quando é preciso armar o equipamento via satélite para transmitir os votos. “A gente precisa andar pela ilha até achar o sinal, pois as árvores atrapalham. Mas não chega a ser um problema”, diz.
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