Procurador da Lava Jato percorre o país em ‘cruzada’ contra a corrupção
ESTELITA HASS CARAZZAI
DE CURITIBA
Coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, o procurador da República Deltan Dallagnol, 35, já perdeu a conta de quantas palestras deu nos últimos meses.
Desde março, ele esteve em pelo menos oito Estados para falar da campanha Dez Medidas Contra a Corrupção. Lançada pelo Ministério Público Federal, ela propõe alterar as leis de combate ao crime e dar celeridade ao Judiciário.
Na semana passada foram três eventos, no Paraná e em Santa Catarina. Antes, esteve no Rio de Janeiro. Cerca de R$ 20 mil foram gastos em passagens e diárias até aqui —em alguns casos, conciliadas com outras agendas de trabalho.
Mas Dallagnol não está sozinho: aderiram à campanha sociedade civil e cerca de 150 procuradores, que organizam palestras em suas cidades na “cruzada” contra crimes de colarinho branco.
Um milhão e meio de assinaturas precisam ser colhidas para que as propostas cheguem ao Congresso. Até agora, 400 mil foram obtidas.
Uma das propostas é criminalizar o enriquecimento ilícito de agentes públicos, aumentar penas para corrupção e tornar mais difícil a prescrição de ações penais.
MOTIVAÇÃO
Mestre em Direito por Harvard, Dallagnol é o “grande mentor” da campanha, segundo colegas.
Nas palestras, os procuradores reproduzem suas falas, dizendo que estão num momento de “alinhamento de planetas” com a Lava Jato e que querem aproveitar a “janela de oportunidade para fazer um país mais justo”.
Críticos dizem que o discurso é “demagógico e emocional”. “Jogam para a plateia. Querem endurecer o sistema aumentando pena e cerceando o direito de defesa”, diz o advogado e professor da USP David Teixeira de Azevedo.
“A mudança [nas leis] deve ser sempre feita de forma técnico-científica”, defende Marcelo Leonardo, que leciona na UFMG e advoga para a Mendes Júnior na Lava Jato.
Dallagnol rebate: “As soluções que propomos são dos maiores especialistas no combate à corrupção”. Segundo ele, as medidas foram elaboradas por sociedade e meio acadêmico e são abertas à consulta pública.
Nas palestras, fala-se do deputado federal Paulo Maluf (PP-SP), do juiz Nicolau dos Santos Neto e de outros casos que ainda não foram julgados ou prescreveram.
“O nosso sistema de Justiça é disfuncional”, afirma Dallagnol. “Várias pessoas desistem, porque veem que seu esforço não resulta em nada. É enxugar gelo.”
Os discursos citam decisões de tribunais superiores, como a que anulou a operação Castelo de Areia. Vem daí o entusiasmo por medidas que evitem que pequenos erros derrubem operações, e a restrição do uso de habeas corpus que não discutam o direito de ir e vir.
A campanha tem sido apoiada por igrejas, empresas e até times de futebol. Assinaturas são colhidas em cultos, feiras de negócios, manifestações ou na praia.
Panfletos e adesivos da campanha estão sendo distribuídos pelo país —o gasto do MPF com o material foi de R$ 172 mil até agora.
Em Curitiba, os procuradores da Lava Jato recebem o que chamam de “cartinhas de amor”: cidadãos comuns que declaram apoio à investigação e celebram os resultados. Foi justamente isso, segundo Dallagnol, que estimulou o grupo a pensar nas dez medidas. “Não somos os salvadores da pátria. A sociedade está colocando sobre nós uma expectativa que não somos capazes de entregar.”